A PRODUÇÃO IMOBILIÁRIA DE MERCADO EM MARABÁ: O BAIRRO PLANEJADO CIDADE JARDIM

MARCEL AFFONSO DE ARAÚJO SILVA
Graduado em Direito pela UNIFESSPA

RESUMO EXPANDIDO 
Apresenta-se aqui um projeto de pesquisa em desenvolvimento, cujo objetivo é compreender a produção imobiliária de mercado em Marabá, uma cidade média do Estado do Pará, a partir do caso do bairro planejado Cidade Jardim. 

Verifica-se que desde 2006, a cidade de Marabá tem sido cenário de intensivas transformações do espaço intraurbano. Destaque-se que muitas destas são viabilizadas a partir da iniciativa privada, que emprega o capital necessário para promover as metamorfoses espaciais, com profundos rebatimentos sociais, culturais e econômicos. 

A incorporação de loteamentos urbanos, como os bairros planejados, de condomínios fechados, de shoppings centers, a construção de hotéis e redes de varejo, que passaram a fazer parte consideravelmente da paisagem urbana, como produto da ação conjunta de construtoras, incorporadoras e investidores com agentes locais (em especial, com proprietários de terra e empresários). As produções imobiliárias de mercado também recebem apoio direto ou indireto do Estado. 

Vale mencionar que essa expansão e dispersão urbana e difusão de novos produtos imobiliários na cidade é uma tendência global, através da qual os novos empreendimentos visam justamente reproduzir formas e conceitos urbanísticos baseados em outras realidades. Maricato (2018) destaca que esta tendência, na realidade, visa impor às cidades uma forma de uniformização, na qual o espaço urbano passa a ser manejado de forma a criar uma imagem positiva e promissora, sempre associada às ideais de modernidade. 

Mas, o que se observa na periferia desses grandes empreendimentos é uma realidade totalmente diferente, na qual se sobrepõe o improviso urbano e paisagístico motivado pela informalidade, características dominantes no restante da cidade. Há, na realidade, uma produção dual do espaço urbano na periferia do capitalismo (MARICATO, 2018). 

Dessa forma, é importante compreender as origens e as contradições da expansão urbana e dos novos produtos imobiliários na cidade de Marabá. Nesse sentido, deve ganhar destaque o lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), em 2009 (CARDOSO, 2013). 

A partir desse programa e das oportunidades que ele concedia tanto para as famílias de baixa renda quanto para as incorporadoras, construtoras e imobiliárias, as mudanças no espaço urbano da cidade se tornaram mais latentes, haja vista que a reprodução do capital imobiliário passou a se concentrar em uma produção massificada de grandes empreendimentos verdadeiramente lucrativos.

Isso se deu em virtude da abertura do mercado imobiliário para os segmentos base da economia, alcançando cada vez mais pessoas que buscavam locais diferenciados para se estabelecerem, de tal modo que a produção imobiliária deixou de se concentrar especificamente em potenciais clientes de alta renda e passou a abarcar o enorme mercado de cidadãos de renda média/baixa, fato favorável ao fortalecimento do setor imobiliário no país, que viveu momentos de extrema lucratividade (SHIMBO, 2010; MELAZZO, 2013).

Tal acontecimento deu ensejo ao crescimento da cidade, que vem sendo impulsionado pela intensa dinâmica imobiliária, a qual pode ser traduzida como a expressão da acumulação do poder e intensiva competitividade pelos melhores e mais rentáveis espaços da paisagem natural. A dinâmica imobiliária reproduz rebatimentos concretos na paisagem urbana da cidade, operando diretamente nas relações sociais, ambientais e jurídicas. 

Um dos casos mais emblemáticos da reprodução do espaço urbano de Marabá é o bairro planejado Cidade Jardim, um loteamento urbano com 7.845 terrenos implantado às margens da Rodovia Transamazônica, cuja construção se deu em 2010.

Trata-se de uma obra da Buriti Empreendimentos, empresa especializada em planejamento urbano que conta com empreendimentos por todo o Brasil, cujo principal nicho de mercado são os chamados bairros planejados, loteamentos urbanos abertos, que conjugam planejamento urbanístico, infraestrutura urbana e permissividade do Estado. 

Com isso a cidade ganhou novos contornos no entorno do bairro planejado Cidade Jardim, assim como ocorreu com a criação do distrito industrial no projeto ALPA/ALINE, que viabilizou uma expansão urbana em sua direção e também em direção à Transamazônica. 

Assim, a cidade proporciona à classe dominante a possibilidade de ampliar territorialmente seu domínio, no entanto, o capital imobiliário é um falso capital, sendo um valor que se valoriza, mas cuja origem de tal valorização não é a atividade produtiva, mas a monopolização do acesso a uma condição indispensável àquela atividade.

Daí a importância de debater e discutir a produção imobiliária de mercado em Marabá (PA) a partir do caso do loteamento fechado Cidade Jardim, na medida em que é necessário compreender os processos de produção do espaço urbano e as transformações do cotidiano da cidade. 

Portanto, é necessário compreender de que forma, por meio da produção imobiliária de mercado, novos espaços urbanos estão sendo consumidos e transformados para atender a demanda capitalista e econômica tanto do Estado quanto do setor imobiliário. Fato que se percebe na implementação do loteamento Cidade Jardim, na medida em que sua viabilização se deu em parceria com uma empresa do Grupo Leolar, que desde 2008 passou a investir no segmento imobiliário, vendo a oportunidade de maximizar seus lucros através da exploração de mais um nicho de mercado em crescimento na cidade de Marabá. 

Diante das discussões, a hipótese é que o bairro planejado Cidade Jardim potencializa o processo de expansão urbana pela valorização da moderna propriedade da terra por meio da produção imobiliária de mercado na cidade de Marabá – PA. 

REFERÊNCIAS 
CARDOSO, Adauto Lucio. O programa minha casa minha vida e seus efeitos territoriais. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2013. 

MARICATO, E. O impasse da política urbana no Brasil. 5 ed. São Paulo. Vozes. 2018. 

MELAZZO, E. S. Estratégias fundiárias e dinâmicas imobiliárias do capital financeirizado no brasil. Mercartor, Fortaleza, v. 12, n. 2, p.29-40, set. 2013. 

SHIMBO, L. Z. Habitação Social, Habitação de Mercado: a confluência entre estado, empresas construtoras e capital financeiro. 361 f. Tese (Doutorado) - Curso de Arquitetura e Urbanismo, Escola de Engenharia de São Carlos, USP, São Paulo. 2010.

Comentários

  1. Considerando que o empreendimento Leolar deixou de existir e os investimentos voltaram se ao mercado imobiliário, em que medida é possível afirmar que o capital comanda as transformações urbanas ao mesmo tempo em que permanece nas mesmas mãos?

    Sara Brígida Farias Ferreira
    Discente PPGPAM

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  2. Considerando que o empreendimento Leolar deixou de existir e os investimentos voltaram se ao mercado imobiliário, em que medida é possível afirmar que o capital comanda as transformações urbanas ao mesmo tempo em que permanece nas mesmas mãos?

    Sara Brigida Farias Ferreira

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    1. O Grupo Leolar é um bom exemplo de monopólio do capital, haja vista ter capitaneado a parceria à construção do bairro planejado Cidade Jardim, que só foi possível através de uma reintegração de posse onde 450 famílias foram compulsoriamente remanejadas, em cumprimento a uma ordem judicial. Em que pese ter deixado de existir, foram aproximadamente 8 mil terrenos destinados à classe média/alta, sendo o maior empreendimento imobiliário de Marabá, que, com a especulação gerada à época, criou um novo espaço de produção imobiliária (Cidade Jardim, Total Ville e Delta Park) a 5 km da Nova Marabá, onde os menos favorecidos, via de regra, só entram para prestar serviços, normalmente braçais.

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  3. Bairros novos, identificados como planejados, passam a ser delineados segundo a lógica do capital, em que uma empresa incorpora uma grande área, viabiliza a urbanização, a infraestrutura de ruas, e a comercialização dos terrenos. Nessa dinâmica, registra-se também o signo da distinção, o que vai diferenciar as classes sociais a partir daqueles que podem comprar o acesso a mercadoria habitação. Nesse sentido, a partir das novas formas de ocupação na cidade de Marabá relacionada ao referido empreendimento imobiliário, você o percebe como elemento que aprofunda as desigualdades sócio-espaciais?

    Aline Tarcila de Oliveira Lima

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  4. Ao seu vê o mercado imobiliário favorece a aquisição da casa própria apenas para a classe média e alta?

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    1. As condições de financiamento imobiliária excluem a classe de baixa renda da tendência de aquisição da casa própria. No próprio marketing usado pelos empreendimentos é possível identificar a qual público aquela empreitada é destinada.

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  5. Olá Marcel. Muito pertinente a sua pesquisa.
    A cidade de Marabá vem crescendo em população e empreendimentos imobiliários nos quatro cantos da cidade. Porém, há muitas famílias sem possuir a tão sonhada casa própria. Qual o seu olhar com relação a situação de falta de moradia da grande massa populacional da cidade de Marabá. Haja visto que há muitos empreendimentos imobiliários , transformações no urbanização da cidade?

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    1. A grande celeuma gira em torno da marginalização da população de baixa renda, uma vez o Programa Minha Casa Minha Vida se estabeleceu nos bairros São Félix/Morada Nova, com péssimas condições de acesso por via de transporte público. Para trabalhar, mesmo estando fora do fluxo de capital, os menos favorecidos necessitam morar em regiões centrais, onde os valores são mais altos, assim, o mercado lucrativo de aluguéis tende a se perpetuar em Marabá, impossibilitando a aquisição da casa própria.

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  6. Considerando a implantação do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) em Marabá, em outros bairros distantes do centro urbano, para as famílias de baixa renda. Como você analisa as desigualdades espaciais do empreendimento estudado e a implantação desse programa para as famílias de baixa renda?

    Emílio Campos Mendes

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    1. As desigualdades citadas na pergunta representam o cerne da pesquisa, já que no bairro Cidade Jardim existe uma parceria público privada para estruturação logística, com mapeamento de segurança, saneamento e incentivo ao crescimento (48 hectares foram doados para a construção do Campus III da UNIFESSPA, como um meio de desenvolver a região). Enquanto nos conjuntos habitacionais do MCMV a comunidade padece com falta de água, sem transporte público e insegurança. Problemas comuns à periferia.

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  7. Considerando que o residencial Cidade Jardim é adjacente ao campus da Unifesspa. Você considera que esse bairro planejado proporciona à classe dominante a possibilidade de ampliar seu domínio, pois constroem imóveis como forma de ganhar dinheiro da população de baixa renda que utiliza a universidade?

    Pollianni Leão da Silva

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    1. O mercado de aluguéis na cidade de Marabá se tornou altamente lucrativo após as especulações surgidas a partir de 2008. Especificamente sobre o Cidade Jardim, a ideia inicial com a doação de 48 hectares para a construção da cidade universitária, era justamente promover a aquisição de lotes ao entorno para construção de casas e condomínios para aluguel. O estudante que ali reside e não tem seu próprio veículo fica bastante restrito no que tange ao acesso aos núcleos Nova Marabá, Cidade Nova e Velha Marabá, mas o capital trabalha para os próprios interesses, essas preocupações são tidas como periféricas, haja vista que o objetivo, que seria a venda de lotes, foi atingido.

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  8. Bairros novos, identificados como planejados, passam a ser delineados segundo a lógica do capital, em que uma empresa incorpora uma grande área, viabiliza a urbanização, a infraestrutura de ruas, e a comercialização dos terrenos. Nessa dinâmica, registra-se também o signo da distinção, o que vai diferenciar as classes sociais a partir daqueles que podem comprar o acesso a mercadoria habitação. Nesse sentido, a partir das novas formas de ocupação na cidade de Marabá relacionada ao referido empreendimento imobiliário, você o percebe como elemento que aprofunda as desigualdades sócio-espaciais?
    Maria Aparecida Ramos de Jesus

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    1. O bairro planejado Cidade Jardim foi idealizado a partir da reintegração de posse de uma fazenda, onde estavam 450 famílias, muitas delas hoje moram nos conjuntos habitacionais do MCMV, mas as diferenças de infraestrutura são patentes. Apesar de ambos terem a atuação objetiva do Estado, a priorização de um em detrimento do outro, coloca em evidência qual o critério utilizado para a disponibilização de mais recursos para obras e segurança: o volume de capital.

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  9. A produção imobiliária está relacionada com a expansão de empresas de outras cidades para Marabá? Nas cidades próximas de Marabá ocorre a inserção de novas empresas imobiliárias?

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  10. Marabá passou por um boom imobiliário, que chamou a atenção de diversas incorporadoras (dentre elas a Buriti Empreeendimentos) que já vinham fazendo parcerias com o Estado em outras cidades/estados do país. Com a possibilidade de abertura da ALPA, o capital se direcionou para a região, que foi chamada pela Revista Veja de Tigres Amazônicos, em uma alusão aos Tigres Asiáticos, e se mostrou altamente rentável, principalmente pelos incentivos/isenções dados pela máquina estatal.

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